Prorrogação de ata de registro de preço superior a 1 (um) ano: novas considerações

Novas considerações sobre a prorrogação de ata de registro de preços superior a 1 (um) ano[1]

Hidemberg Alves da Frota

Em artigo pretérito deste autor[2], recordou-se que o Tribunal de Contas da União, na terceira edição da obra Licitações & contratos: orientações básicas, em conformidade com o art. 4o, caput, do Decreto nº 3.931, de 19 de setembro de 2001, aduz: “Admite-se prorrogação da validade da Ata de Registro de Preços por mais doze meses, em caráter excepcional, devidamente justificado e autorizado, quando a proposta vencedora continuar sendo mais vantajosa para administração.” [3]

Com efeito, compulsando-se a jurisprudência daquela Corte de Contas, deparou-se com o Acórdão n.º 3034/2005 — Primeira Câmara, cujo relatório (itens 36 a 38), da lavra do Ministro Marcos Vinicios Vilaça, reconheceu, à luz do art. 4.o, § 2.º, do Decreto Presidencial n.º 3.931/2001, c/c art. 57, § 4.º, da Lei n.º 8.666, de 21 de junho de 1993, a legalidade de prorrogação de ata de registro de preços por período superior, em até um ano, ao prazo máximo de também um ano contido no art. 4.o, caput, do mesmo ato administrativo normativo:

[…] 34. Nesse compasso, o primeiro ponto a analisar é a possível contradição entre o período de validade do registro de preços, um ano, e a previsão de entrega do último lote de aquisição, janeiro de 2007.

  1. Examinando o edital, constata-se que, efetivamente, o item 1.2 reza que os preços registrados neste processo terão validade de 01 (um) ano, a partir da data da publicação da Ata de Registro de Preços do Ministério da Saúde no Diário Oficial da União.

  2. Contudo, a minuta de Ata de Registro de Preços contém previsão, na Cláusula II – Da Validade dos Preços, Parágrafo Segundo, de que a ata poderá ter a vigência prorrogada, nos termos do § 2º do art. 4º do Decreto nº 3.931/2001, bem como do § 4º do art. 57 da Lei nº 8.666/93.

  3. De fato, compulsando-se a legislação mencionada, verifica-se que é admitida a prorrogação da vigência da Ata, se conforme ao art. 57, § 4º, da Lei de Licitações, e se a proposta continuar se mostrando mais vantajosa e foram satisfeitos os demais requisitos do Decreto nº 3.931/2001.

  4. Ademais, a Cláusula VIII – Do Reajustamento de Preços prevê que a Ata poderá sofrer alterações, obedecidas as disposições contidas no art. 65 da Lei nº 8.666/1993, o qual estipula as condições em que os contratos administrativos poderão ser alterados, sendo uma delas, para citar como exemplo, a variação do valor contratual para fazer face ao reajuste de preços previsto no próprio contrato. E o exame do contrato demonstra que esse reajustamento foi previsto na Cláusula Décima Primeira.

  5. Assim, considera-se que não existe a alegada contradição entre a validade do registro de preços e o período de fornecimento de bens, uma vez que tanto o edital quanto a Ata e a minuta de contrato contêm cláusulas prevendo as possibilidades de reajustamento de preços, em conformidade com a legislação vigente. […][4]

Em idêntico sentido se situa o magistério de Jorge Ulisses Jacoby Fernandes, segundo o qual o art. 4.o, § 2.º, do Decreto Presidencial n.º 3.931/2001, prevê excepcional prorrogação da ata de registro de preços “por até um ano”[5], se contemplados os requisitos contidos em tal parágrafo, ou seja, quando a proposta continuar se mostrando mais vantajosa e se satisfizerem os demais requisitos do ato administrativo normativo em estudo.

No tocante ao requisito da manutenção da proposta mais vantajosa, recomenda Jacoby Fernandes seja ela aferida “pela pesquisa de preços, pela satisfação dos usuários e eficiência das contratações”[6] e motivada “sempre à luz do interesse público”[7].

Ao comentar a necessidade de observância das demais balizas do Decreto Presidencial n.º 3.931/2001, o festejado administrativista considera “possível o acréscimo de quantitativos iniciais”[8], acaso haja anuência dos fornecedores, cuja concordância, frisa, também é essencial para a prorrogação excepcional do prazo da ata de registro de preços. A imprescindibilidade da chancela dos particulares se evidencia ante o fato de que a prorrogação excepcional distancia a Administração Pública “das condições originalmente estabelecidas com os fornecedores”[9], a ensejar (além da indispensabilidade da aprovação das partes para se efetuarem a prorrogação da ata de registro de preços e “o acréscimo de quantitativos iniciais”[10]), “parcimônia na aplicação de penalidades”[11] por parte do Estado-administração.

Entretanto, consoante esclarece lição de Marçal Justen Filho, o art. 4.o, § 2.º, do Decreto n.º 3.931/2001, contraria o teor do art. 15, § 3.º, III, da Lei n.º 8.666/1993, uma vez que em tal disposição legal figura a validade do registro não superior a um ano como uma das condições a serem respeitadas pelo regulamento do Sistema de Registro de Preços — no plano federal, correspondente ao Decreto Presidencial n.º 3.931/2001. Salienta o docente paranaense:

É evidente a impossibilidade de aplicar ao registro de preços a determinação específica e excepcional contida no art. 57, § 4º, da Lei de Licitações. Essa disposição refere única e exclusivamente aos contratos de prestação de serviços contínuos. Não é extensível a qualquer outra manifestação contratual. Uma ata de registro de preços não retrata um “serviço continuado”. Quando muito, é uma relação jurídica continuada. A disposição examinada contraria frontalmente o texto expresso da Lei.[12]

Em se tratando de norma de âmbito nacional, calha ao regulamento do Sistema de Registro de Preços de cada ente federativo prescrever validade da ata de registro de preços não superior a um ano. Norma nacional porque o caput do § 3.º do art. 15 da Lei n.º 8.666/1993 incumbe à regulamentação, via decreto, do Sistema de Registro de Preços atender às peculiaridades regionais, porém emoldura estas pelas condições gerais, dentre as quais se encontra a validade do registro não superior a um ano (inciso III):

[…] Art. 15. As compras, sempre que possível, deverão:

[…] 3.º O sistema de registro de preços será regulamentado por decreto, atendidas as peculiaridades regionais, observadas as seguintes condições:

I – seleção feita mediante concorrência;

II – estipulação prévia do sistema de controle e atualização dos preços registrados;

III – validade do registro não superior a um ano.

Por isso, este autor evoluiu em seu pensamento e passou a adotar entendimento discordante do posicionamento do Tribunal de Contas do Município de São Paulo, cuja jurisprudência, a exemplo dos acórdãos dos autos dos Processos TC n.º 2.631/97*60, TC n.º 652.97-69 e TC nº 251.97-18, acolhe este entendimento de Jessé Torres Pereira Júnior: “A organização de um sistema de registro de preços é matéria operacional, que o artigo 115 incumbe aos órgãos da Administração no âmbito de suas respectivas competências, daí não se revestirem de caráter geral os §§ 1º a 5º do art. 15”.[13]

[1] Versão original deste artigo publicada nestes periódicos jurídicos: Revista IOB de Direito Administrativo, São Paulo, v. 4, n.º 42, p. 206-209, jun. 2009; Repertório IOB de jurisprudência: tributário, constitucional e administrativo, São Paulo, v. 1, n.º 1, p. 32-31 (paginação decrescente), 1.ª quinz. jan. 2007; Juris Plenum, Caxias do Sul, v. 1, n.º 99, mar. 2008. 2 CD-ROM. (Parte integrante da Revista Jurídica Juris Plenum — ISSN 1807-6017.) Revisado em 24 de outubro de 2018. Vide PDF aqui.

[2] FROTA, Hidemberg Alves da. Considerações sobre prorrogação de ata de registro de preço superior a 1 (um) ano. L & C, Brasília, DF, v. 10, n.º 106, abr. 2007, p. 27-33.

[3] BRASIL. Tribunal de Contas da União. Licitações & contratos: orientações básicas. 3. ed. Brasília, DF: TCU, 2006, p. 102. Disponível em http://www.tcu.gov.br. Acesso em 10 out. 2006.

[4] BRASIL. Tribunal de Contas da União. Decisão TCU n.o 3034/2005 — Primeira Câmara. Relator: Ministro Marcos Vinicius Vilaça. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 7 dez. 2005. Disponível em: http://www.tcu.gov.br. Acesso em: 19 dez. 2006.

[5] FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Sistema de registro de preços e pregão presencial e eletrônico. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2006, p. 407.

[6] Ibid., loc. cit.

[7] Ibid., loc. cit.

[8] Ibid., loc. cit.

[9] Ibid., loc. cit.

[10] Ibid., loc. cit.

[11] Ibid., loc. cit.

[12] JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 11. ed. São Paulo: Dialética, 2005, p. 157.

[13] PEREIRA JÚNIOR, Jessé Torres. Comentários à lei de licitações e contratações da administração pública. 4. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1997, p. 112. Apud SÃO PAULO. Tribunal de Contas do Município de São Paulo. Processos TC n.º 2.631/97*60, TC n.º 652.97-69 e TC n.º 251.97-18. Disponíveis em http://www.tcm.sp.gov.br/Jurisprudencia/juribusca_inter.asp. Acesso em 20 dez. 2006.

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